quarta-feira, outubro 29, 2025
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Plano Clima pode punir produtores e enfraquecer agricultura de baixo carbono, diz especialista



Criado em 2008, o Plano Clima foi o primeiro documento a reunir políticas de mitigação e adaptação do país. A proposta atualizada, em discussão no governo, deveria integrar as estratégias de diversos setores. Porém, segundo autoridades e entidades ligadas ao agronegócio, o plano não cumpre esse papel e atribui culpa ao produtor rural.

Para o diretor-geral da Agroicone, Rodrigo Lima, a entrega do documento na COP30, em Belém, é equivocada. Isso porque o plano não traz base técnica sólida e pode atribuir ao campo emissões que não correspondem à realidade do setor.

“Na teoria, faz sentido associar emissões por uso da terra ao setor agropecuário. Mas, na prática, o Brasil não tem uma base de dados confiável para delimitar essas áreas. Isso pode distorcer os números e gerar interpretações equivocadas sobre o papel do agro”, afirma.

Falta de integração entre planos setoriais

Outro ponto de atenção é que se o novo Plano Clima for aprovado da forma como está, a agenda de agricultura de baixo carbono construída nos últimos anos pode ser enfraquecida.

“O Plano Clima precisava ser o guarda-chuva que organiza e dá coerência às ações de todos os ministérios. No entanto, o que se vê é uma soma de intenções sem base metodológica comum”, avalia Rodrigo Lima.

Ele lembra que o Brasil já possui instrumentos robustos, como o Programa ABC+, voltado à agricultura de baixo carbono, e o Plano de Prevenção e Controle do Desmatamento na Amazônia (PPCDAm). “O ideal seria alinhar o Plano Clima a essas políticas já existentes, em vez de criar novas estruturas sem coordenação”, pontua.

Produtor rural em risco

A forma como o Plano Clima redistribui as emissões também preocupa o setor. Segundo Lima, incluir todo o desmatamento ocorrido em imóveis rurais como responsabilidade da agropecuária é uma distorção.

“O produtor pode ser penalizado por emissões de áreas que não estão sob sua gestão direta, como assentamentos ou terras públicas. Isso traz insegurança e pode afetar o acesso ao crédito rural”, explica.

Para ele, a política ambiental deve continuar sendo conduzida por órgãos especializados, como o Ibama e o Ministério do Meio Ambiente, e não pelo Ministério da Agricultura. “O Mapa não tem atribuição legal para fiscalizar desmatamento. Criar essa expectativa é deslocar o papel das instituições e sobrecarregar o produtor”, afirma.

Plano ainda incompleto e sem definição de custos

Outro ponto sensível é o estágio de elaboração do plano. O especialista destaca que as estratégias de monitoramento e financiamento ainda estão em consulta pública. “Estamos discutindo um documento sem ver a parte que explica como ele será implementado, quem vai pagar a conta e quais incentivos econômicos estão previstos”, diz Lima.

Neste sentido, o governo corre o risco de apresentar um plano incompleto antes da COP30, em 2025, apenas para demonstrar avanço político. “É importante ter ambição climática, mas ela precisa vir acompanhada de realismo técnico. Sem isso, o plano pode perder credibilidade”, alerta.

Avanços do agro devem ser reconhecidos

Além disso, Lima defende que o Brasil adote uma abordagem mais equilibrada, reconhecendo os avanços já alcançados pelo agronegócio em sustentabilidade.

“O setor rural brasileiro tem papel fundamental na redução de emissões, seja pela recuperação de pastagens, pela integração lavoura-pecuária-floresta ou pelo uso racional de insumos. O Plano Clima deveria fortalecer essa agenda, e não tratá-la como problema”, afirma.

Para ele, reforçar políticas como o Plano ABC+ e ampliar o acesso a financiamento verde seriam passos mais eficazes para alcançar as metas de 2035. “O caminho não é punir quem já está fazendo o certo, mas estimular quem quer seguir nessa direção”, conclui.



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