procuram-se influenciadores fora da bolha
Nos últimos anos, o Brasil viu crescer uma divisão preocupante entre o campo e a cidade. A palavra agronegócio, que por tanto tempo simbolizou desenvolvimento, segurança alimentar e orgulho nacional, passou a ser interpretada por muitos brasileiros como algo distante, ganancioso e impessoal. Em certos círculos urbanos, tornou-se sinônimo de exclusão social, desigualdade e até destruição ambiental.
Mas o problema não está na essência do setor. O agro brasileiro é produtivo, tecnológico e resiliente. Enfrenta adversidades climáticas, logísticas e econômicas. E, mesmo assim, garante diariamente comida no prato de mais de 200 milhões de brasileiros. Em meio a crises, inflação e instabilidade global, é o produtor rural brasileiro que sustenta a base da nossa alimentação e da nossa economia.
O verdadeiro desafio está na forma como o agro se comunica. Quem falou por nós contribuiu para a polarização. Durante muito tempo, o setor falou apenas para dentro, criou o nós e eles. As campanhas, os discursos e até os influenciadores voltaram-se quase exclusivamente ao público do campo. A cidade ficou de fora da conversa — e quando ouve, muitas vezes ouve mal. Falta contexto, falta conexão, falta tradução. Resultado: o que poderia gerar orgulho, muitas vezes gera ressentimento.
Essa distância aumentou com o comportamento de alguns dos chamados “influenciadores do agro”. Em vez de abrir diálogo com o público urbano, adotaram um tom confrontador, por vezes arrogante. Passaram a tratar o consumidor brasileiro como inimigo, como alguém mal informado ou contrário ao progresso. Mas não é atacando quem está na cidade que vamos melhorar a imagem do agro brasileiro. É explicando, com empatia e paciência.
O brasileiro urbano médio, que talvez nunca tenha pisado numa lavoura, muitas vezes não tem ideia do impacto direto que as exportações agrícolas têm em sua própria vida. Ao ver que o Brasil lidera a exportação global de soja, café ou suco de laranja, sua reação imediata é pensar que o agro está apenas ganhando dinheiro enquanto ele paga mais caro no supermercado. Falta a compreensão de que, ao exportar, o agro traz dólares para o país, fortalece o real, garante superávit comercial, equilibra a economia e evita inflação. Exportar também é uma forma de alimentar o Brasil.
Por isso, proponho algo simples e simbólico: substituir a palavra agronegócio por agroalimento. Porque é isso que o agro produz: alimento de verdade. É arroz com feijão, é café com leite, é pão com manteiga, é salada na feira, é comida na merenda escolar. É o prato do trabalhador, da criança, da dona de casa. É o que nos une.
A palavra agroalimento aproxima. Tira o agro da esfera fria dos números e o devolve ao calor humano da cozinha. Alimento tem cheiro, tem história, tem memória, tem afeto. Ao falarmos de agroalimento, lembramos que tudo começa com o produtor, mas termina no garfo do cidadão.
Não se trata de maquiagem. Trata-se de reconexão. O agro não precisa de aplauso. Precisa de compreensão. E, para isso, precisa mudar o tom.
Também é urgente orientar quem inflencia em nome do setor. Chega de vozes que gritam para os convertidos e atacam quem deveria ser acolhido. Precisamos de comunicadores que saibam explicar com clareza e escutar com respeito. Que falem com quem consome e não apenas com quem produz. Que saibam que, do outro lado da tela, há uma família que compra arroz, feijão, carne e verdura — e quer apenas entender de onde vem o que está no seu prato.
O agro alimenta. O agro sustenta. Mas o agro também precisa escutar.
É hora de criar uma Frente Brasil pelo Agroalimento. Um movimento nacional por uma comunicação mais inclusiva, mais humana, mais eficaz. Um movimento que una produtores, entidades, empresas e jornalistas e todos os consumidores em numa nova narrativa. Uma narrativa onde o agro entra na mesa do consumidor não pela imposição, mas pela verdade e pela empatia.
Quanto mais o Brasil urbano entender o agro como alimento e não como inimigo, mais respeito o setor conquistará. O campo não é distante. Está na nossa rotina mais íntima. Está no prato de todo dia. E quando o consumidor enxergar isso, talvez, além de respeito, o agro conquiste de volta algo ainda mais importante: o orgulho nacional.


*Marcelo Lüders é presidente do Instituto Brasileiro do Feijão e Pulses (Ibrafe), e atua na promoção do feijão brasileiro no mercado interno e internacional
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